Sobre a vida e a morte

Sobre a vida e a morte

7 de novembro de 2022 Off Por funes

Sobre a vida e a morte por Delzymar Dias.

Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 15/07/2022.

 

Um médico fixa o olhar em seu celular enquanto um paciente precisa da sua atenção. A dor do paciente e a angústia da família parecem menos importante naquele momento. Enquanto a angústia aumenta, perguntas aleatórias são fei- tas por alguém que deveria fornecer, no mínimo, atenção, já que não existe estrutura adequada para um atendimento adequado com amplos recursos.

Entre receitas, palpites, angústias e um diagnóstico fora da realidade, eis que surge um “vá pra casa que mais parece um “deixe pra lá,deve ser bobagem”. O desinteresse daquele momento se transforma em uma negligência humana impossívelde ser reparada. O celular venceu.Mereceu mais atenção naquele momento do que alguém que precisavade ajuda, de uma atitude, do mínimo de cuidado, já que não sesabia de fato o que estaria causandodores tão fortes em uma região de diagnóstico comum.

 

 

 

Na manhã seguinte, após a libe- ração precipitada e o retorno para casa, o quadro se agravava. Entre idas e vindas a casas de saúde, a regulação de uma vaga e uma transfe- rência mais parecia um jogo de sorte, comandado por algumas pessoas que não demonstram um grande in- teresse em resolver o problema naquele momento ou não entendem a gravidade da situação. Nesse caso, é melhor mesmo passar a bola para outro lugar. Ao chegar em um novo ambiente, a peregrinação toma pos- se de novas angústias.

Existem grandes parceiros aliados nessa batalha. Enfermeiras, ma queiros, funcionários em geral, pessoas que se preocupam de verdade com o bem estar de quem sofre, porém, existem limites que esses profissionais atenciosos não conseguem ultrapassar. Falta empatia por parte de alguns com a dor e o sofrimento do outro que está em apuros. O outro, nesse caso, tanto é o paciente como a família que espera por diversas ocasiões uma informação que geralmente não chega.

Às vezes me pergunto se isso é uma falha do sistema educacional do qual faço parte. Estamos formando pessoas capazes de sentir empatia pelo sofrimento do outro? Até que ponto os futuros profissionais se preocupam de verdade com a dor e o sofrimento do outro? Como conseguir separar aquilo que deveria ser vocação da busca pelo status social? Em Pedagogia dos Caracóis, o educador Rubem Alves se questiona sobre as possibilidades e necessidades de ensinar compaixão. Parece sem sentido falar nisso em sala aula, já que não cai em prova. A compaixão está cada vez mais distante dos bancos escolares. Rubem Alves diz que somente o conhecimento com compaixão cria a bondade, alertan- do que uma sociedade em que não existe bondade não é digna de que vivamos nela.

O final dessa história não é feliz. Não existe felicidade quando enten- demos que algo a mais poderia ter sido feito. Fernando Pessoa, ao falar sobre a morte diz que:

E tudo isto a morte / Risca por não estar certo/ No caderno da sorte / Que Deus deixou aberto. A vida é isso. Poeira ao vento e uma impressão forte, nesse caso, de que o momento e o chegar da hora muitas vezes se materializa como uma condição absolutamente reversível.