Os rios da minha vida*
29 de janeiro de 2024Os rios da minha vida* por Virgílio Trindade**.
Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 26/01/2024.
O meu primeiro rio foi o Genipapo, que cortava o Riacho do Boi, sítio onde nasci, em direção ao Coremas. Dele tenho poucas lembranças, pois a nossa convivência foi curta já que, logo aos três anos, fui levado para a cidade. As recordações mais fortes datam do meu tempo de menino, as visitas escassas e as travessias no cangote do velho meu pai. Era um rio relativamente estreito, de correnteza violenta, que me metia medo.
O meu rio verdadeiro, o segundo, foi o Piancó, companheiro de toda a minha infância, de quem guardo todas as recordações: os banhos na beiradinha, as travessias em canoa, a construção da ponte, os poços permanentes e as enormes enchentes. Largo e forte. Enchia o Coremas com duas ou três “botadas”. Quando passava pela cidade, levava tudo: lavoura, casas, barceiros e até gente. Foi o mais bonito dos rios que conheci e o mais querido dos rios de que me lembro.
Do rio Espinharas, o terceiro, tenho três registros importantes e inesquecíveis: alguns banhos no Poço do Figueiredo, quando das gostosas férias na casa de tia Júlia; o encontro do Farinha com o da Cruz, que eu gostava de assistir da minha rua do 18; e a enchente que levou a ponte nova e os breguetes das casas de Maria José (minha irmã), de tia Nina, do compadre Juarez e de tantos outros amigos que moravam nas proximidades.
Quando cheguei a Patos, vindo de João Pessoa, começava o processo de poluição: galerias, córregos e canaletas jogavam, dentro dele, detritos poluidores e venenosos. Radialista ativo, tentei iniciar um movimento de combate. Fui acusado de boçal e fiquei só. Lembro-me, até, dos argumentos: “Quem já viu rio morrer”? Ou: “Poluição é besteira de gente de cidade grande” Ou, ainda: “Esse sujeito quer é aparecer e criar caso!”
Hoje, tantos anos depois, eu ouço a notícia de que um grupo universitário encabeça um movimento de recuperação do nosso rio e, mesmo sabendo ser uma tarefa difícil, não posso esconder a minha alegria: até que enfim alguém de coragem e bom senso!
Torço pelo melhor resultado e espero ver, ainda, o Espinharas correr livremente como ainda correm, felizmente, o Genipapo e o Piancó. Os rios não podem morrer: eles são um pedaço de nós; dos meninos fogosos e eternos!
(*) Texto produzido originalmente
em 22 de setembro de 1989;
(**) Neste mês, a Funes faz uma homenagem ao escritor, jornalista, professor e radialista paraibano Virgílio Trindade, que morreu em 2009. Por isso,
todos os textos de janeiro serão crônicas assinadas por ele.