Mistérios do Sertão
16 de outubro de 2023Mistérios do Sertão por Aparecida Cardoso.
Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 13/10/2023.
Antigamente, as histórias de assombração eram repassadas através da oralidade de geração a geração. Ouvir essas histórias misteriosas envolvendo seres sobrenaturais também era uma forma de diversão, emoção e reflexão para todas as pessoas que as apreciavam. Atualmente, as tecnologias estão dominando as pessoas de uma forma muitas vezes exagerada, que muitos têm se tornado reféns de um celular, da internet, das redes sociais, deixando até de viver as emoções da vida pessoal.
É nesse sentido que tenho me preocupado com a falta de atenção para com a cultura popular e a preservação da mesma, pois ela é algo que nos faz tão bem por instigar nossa imaginação e ser capaz até de desenvolver o senso crítico. Portanto, resolvi passar para o papel um de vários causos que sempre ouvi quando criança, o qual me divertiu muito e que carrego até hoje na minha mente.
Quando eu era criança, sempre gostava de ouvir histórias que envolviam mistério, causasse medo ou terror. Não sei exatamente porque isso me agradava, acredito que pela curiosidade que me dominava quando a conversa se tratava de algo considerado sobrenatural. É de arrepiar todos os fios de cabelos, até de carecas, a história que eu contarei agora.
Meu avô era caçador e sempre gostava de caçar no Baixio do Padre, nome atribuído a uma propriedade rural no Sertão da Paraíba, na qual, segundo os mais velhos, há muitos anos foram esquartejados um padre e uma moça que com ele fugiu, das bandas do Ceará, e seu pai, um rico fazendeiro, não aceitando tamanho escândalo, mandou por fim na vida dos dois.
O casal foi assassinado debaixo de uma oiticica, e ainda hoje pode-se encontrar resquícios de madeira, da qual foram feitas duas cruzes e colocadas no local por muito tempo. Assim, o Baixio do Padre se tornou um lugar mal-assombrado, pois as pessoas que por lá passavam à noite, sempre tinham uma história pra contar sobre ter se deparado com algo sobrenatural.
Era comum naquele lugar, as pessoas escutarem gemidos, gritos pedindo socorro, vendavais derrubando árvores, as quais no outro dia estavam de pé e no mesmo local. Foi lá no Baixio do Padre que um amigo de meu pai viu um gato com olhos de fogo. Um outro vizinho também chegou contando que durante uma noite de caçada, uma criança surgiu do nada na sua frente e o acompanhou durante um longo percurso até chegar na cancela e de lá, sumiu.
Eram tantas histórias de caçadores diversos que por lá passavam, sendo que alguns, de tanto medo, chegaram a perder seus pertences e nunca mais voltaram lá para resgatá-los.
Meu avô, um homem destemido, sempre ia caçar naquela região dizendo que as pessoas inventavam histórias e que lá não tinha nada estranho, até que em uma noite de lua cheia, vovô já tinha feito o café e já estava armando a rede na espera, quando viu a mata incendiando ao seu redor.
Não tinha mais o que fazer, era esperar morrer queimado pelas chamas, visto que ele estava cercado pelo fogo que se alastrava. O que restava, era orar e pedir a Deus o perdão dos pecados. Feito isso, adormeceu e quando acordou já era dia, o sol estava alto e ele ainda atordoado, olhou para os quatro cantos da propriedade e nenhuma folha de mato, por pequena que fosse estava queimada. Nenhum incêndio aconteceu ali.
Daquele dia em diante, meu avô nunca mais duvidou dos mistérios do Baixio do Padre.