A face do pai
14 de fevereiro de 2024A face do pai por Misael Nóbrega de Sousa.
Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 09/02/2024.
O filho é o pior ramo de toda e qualquer árvore da genealogia humana. Recém-nascido, exaure da mãe as suas energias… – E assim: a enfeia, a debilita e a deprime. Dependurado nas tetas da aleitação, surrupia o seu sustento. Extremamente dependente, habitua-se à chantagem, relegando os pais a escravizados de suas necessidades famintas e às humilhantes sessões de higiene fecais.
Espera na comodidade dos panos, até que venham os primeiros passos… – E o que deveriam ser desafios, tornam-se negligência. A criança agora é um fantoche. É quando os pais materializam as suas próprias frustrações: um tipo de compensação pelo que lhes foram negados no passado. Assim, mal-educadas, aquelas criaturinhas passam a reclamar para si tudo o que veem: coisas que se quebram como os devaneios daquela fase irritante. E nem imaginam que estão ganhando, feito fiúza, as tristes lembranças dos seus progenitores.
Logo chega a adolescência, sepultando uma infância de que nem se recordam. O importante é a é. Então, ele passa a acreditar no mundo. A sua casa não é mais um porto seguro. – O filho é acometido de uma falsa alegria. E nada pode desviá -lo dessa verdade. Não é a queda é o voo. Mais do que se conhecer, testar os próprios limites.
E, quando acredita que já celebrou de tudo, as imagens vão se desintegrando. – Constituindo-se homem não sabe mais o que ser filho. E ele edifica, na liberdade aparente, uma nova prisão, cujos tijolos são os seus dias… – E onde foram agrilhoados seus desejos (e esses são também os seus pecados), que o leva à força de cordões umbilicais. O tempo, então, apresenta-lhe a responsabilidade… – É quando se rompe a efígie de filho e o espelho reflete a face do pai.
Como ato contínuo, trabalha uma forma de bloquear qualquer sentimento de afetividade que possa atrapalhar os seus planos. Pai e mãe voltaram a ser protagonistas de um filme real. Em retribuição, e apenas por isso, encontra dentro do quesito da racionalidade, uma forma de acomodá-los ali… – Pacientes de si mesmos. À noite vem o remorso a sobrevoar-lhe a cama. – Porém, tudo some com a aurora prima.
Enfim, chega o dia em que o filho enterra os únicos que lhe quiseram bem nesta vida… – E que nunca exigiram dele outra coisa que não fosse o perdão… – E deixa o palco para continuar vivendo a representação cênica dele mesmo.
A coluna Funes Cultural vem homenageando escritores patoenses com publicações de textos e biografias. Em janeiro, o protagonista foi o saudoso Virgílio Trindade. Neste mês, o homenageado é o escritor Misael Nóbrega de Sousa, autor de diversas obras, entre elas: O Fantoche (poesia), Espelho (poesia), Cinza das Horas (poesia), A Pedra do Imã (conto), Folhas do Álamo (reflexões), Colcha de Retalhos (crônicas) e A Rua Grande de Meus Pais (crônicas).