O Rio Piranhas e a Pedra do Curtume

20 de maio de 2024 Off Por Funes Patos

O Rio Piranhas e a Pedra do Curtume Por Sebastião Gomes Araújo de Sousa.

Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 17/05/2024.

 

Existe uma pedra grande que fica no meio do leito do Rio Piranhas, como se fosse uma ilha. Ela fica perto de Santa Maria. Quando chove muito, o rio aumenta, fazendo com que a pedra fique encoberta pela água e, quando volta ao normal, a pedra grande divide as águas, formando dois braços. Eram raras as enchentes que cobriam essa pedra. Ela era conhecida porque ali tinha um poço fundo que raramente secava. Quando isso acontecia, cavavam cacimbas e encontravam água com abundância e de boa qualidade. Assim diziam os primeiros habitantes vindos do Seridó.

O nome dessa pedra até 1932 era Pedra Grande do Rio. Nela havia muitos tanques naturais propícios para algumas atividades. O ano de 1932 foi de uma grande seca; morreu muito gado de fome, de sede e de doenças. Naquele tempo, era comum extrair o couro do boi. O couro das ovelhas e das cabras que morriam também era aproveitado para outras finalidades.

Raimundinho Gomes (meu pai), sem trabalho nem renda para o sustento da família, resolveu aprender a curtir couro. Esses couros, depois de curtidos, eram vendidos como sola para fazer arreios, matulão, selas, chinelas currulepes, chapéus de couro, botinas, bizacos, cantil para manter água fria, marra de chocalhos e até gibão.

O couro que não era curtido era chamado de couro cru. Essas peles eram emendadas e usadas para transportar, a curta distância, barro para a construção de balde de açude. Esses couros eram arrastados por boiadas de bois mansos. Com esse curtume artesanal nos tanques daquela pedra, ela ficou sendo conhecida como Pedra do Curtume.

Essa atividade de beneficiar couro começou nos anos 1920, quando o empresário Manoel Onias de Sousa, nascido no Seridó em 1875, já tinha um projeto em andamento para a construção de um curtume no vizinho município de Paulista, onde pretendia instalar outras empresas no ramo da pecuária. Naquele tempo, a demanda aumentava, e Paulista já dava sinais de crescimento. Existia até conversa de que era possível uma ramificação de estrada de ferro que ligava Patos a Mossoró passando por Paulista, caso esses projetos de Manoel de Sousa fossem implantados.

Com o assassinato de Manoel de Sousa, em 1926, essa hipótese caiu por terra e não se falou mais nisso. Em 1932, a necessidade falou mais alto, e Raimundinho Gomes começou essa atividade. Embora fosse artesanal e em pequena quantidade, uma vez que não dava nem para atender a demanda local. No entanto, não foi muito além, visto que, para expandir essa atividade, os recursos eram escassos, Nos anos 1940, parou esse trabalho de uma vez.

Em 1958, também foi um ano de seca; consequentemente, morreu muito gado. Em 1959, Raimundinho ainda curtiu algumas unidades de couro, foi quando eu tive alguma noção sobre essa atividade artesanal. Meu pai já não demonstrava muito interesse em voltar à velha profissão, embora existisse uma grande procura pelo couro curtido.

Naquele lugar, dava-se nome a tudo: aos córregos, riachos, cachoeiras, várzeas, pedras e até aos poços do rio. Esses nomes tinham sempre uma pequena história. Era o caso da Pedra do Curtume, a qual já mencionamos. A Pedra do Batista fica ali perto. Foi em homenagem a um senhor com esse nome que viveu ali, foi embora e não deixou pista; porém, seu nome ficou naquela pedra que todos de Santa Maria conhecem.

Aquele lugar está mudado; acabaram com as barreiras onde ficavam as matas ciliares, e a grande quantidade de peixes desapareceu. Um pouco acima daquela pedra fica o Poço de Mãe Chica. Aquele lugar era fundo e mantinha água o ano inteiro. Esse nome era em homenagem a uma senhora lavadeira de roupas que viveu naquele lugar.

Tião Gomes, autor do texto da semana: “Aquele lugar está mudado; acabaram com as barreiras onde ficavam as matas ciliares”