O tamanho de Allyrio Meira Wanderley
27 de dezembro de 2023O tamanho de Allyrio Meira Wanderley por Delzymar Dias
Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 15/12/2023.
Mergulhamos quase dois anos em arquivos e conversas sobre Allyrio Meira Wanderley. Depois disso, ficou muito evidente que, de fato, estamos falando do maior escritor patoense, não apenas pela qualidade da sua obra, mas por alguns aspectos essenciais que acompanham a trajetória de bons escritores, entre eles, a crítica em torno de sua obra, os impactos dessa produção e a repercussão intensa verificada após a sua morte. Para se ter uma ideia, achamos notas e comentários sobre Allyrio em diversos jornais, mesmo após três anos de sua partida.
A relevância de Allyrio Meira Wanderley no cenário local, estadual e nacional está plenamente documentada. Com o seu falecimento ocorrido no dia 15 de janeiro de 1955, a Associação Paraibana de Imprensa providenciou tudo para que o sepultamento ocorresse em João Pessoa, porém, a família decidiu trazer o corpo de Allyrio para Patos, onde ali seria velado e sepultado. O translado do corpo de Allyrio até o Sertão foi realizado em uma caminhonete do fomento federal, provocando uma onda de comoção entre amigos e admiradores. Em Campina Grande, esperavam pela passagem Raimundo Asfora, Noaldo Dantas, Ramalho Filho, Josias Cavalcanti, entre outras personalidades. O então prefeito de Patos, Darcylio Wanderley da Nóbrega, decretou luto oficial de três dias na cidade. O corpo foi velado na sede da Prefeitura e em seguida foi levado à catedral para a realização da missa. O cortejo que levou o corpo de Allyrio ao cemitério São Miguel contou com uma quantidade significativa de pessoas, segundo notícias publicadas à época. O Jornal O Norte chegou a publicar fotos do sepultamento onde é possível constatar a veracidade da informação.
Na capital da Paraíba, cidade em que atuava no período em que faleceu, foi aprovada uma lei municipal nomeando uma rua de “Allyrio Meira Wanderley”, sancionada prontamente pelo prefeito Luiz de Oliveira Lima. A nível estadual, o deputado Octacílio de Queiroz apresentou um projeto de lei no sentido de liberar crédito especial de 100 mil cruzeiros, autorizando o Governo do Estado a usar o valor para a publicação póstuma das obras inéditas do escritor, coisa que nunca aconteceu, apesar da proposta ter sido aprovada. A nível nacional, dezenas de telegramas e mensagens lamentando a sua morte chegaram às redações, entre os lamentos, estão o do jornalista Assis Chateaubriand, que classificou Allyrio como “um dos maiores articulistas brasileiros dos últimos tempos”.
Allyrio era muito respeitado tanto no meio jornalístico como nas rodas literárias, isso conferia a ele a credibilidade necessária para realizar conferências temáticas onde clarificava as suas teses e ideias. Essas conferências eram divulgadas através dos jornais e sua repercussão também está bem documentada com euforia.
Esse mergulho em sua história e sua obra, fez-me lembrar que a primeira vez que escutei sobre Allyrio Meira Wanderley foi através de um amigo que não está mais entre nós. Mario Gregório Cabral Diniz foi uma das pessoas mais inteligentes que eu conheci. Ele nos apresentou Allyrio de uma forma estimulante, já que era uma das poucas pessoas que conseguiram ter acesso a parte de sua obra. Dez anos após a partida de Mario e quase 70 anos após a morte de Allyrio, as pessoas continuam sem acesso aos seus livros. É inadmissível sob todos os aspectos que essas obras não tenham sido publicadas novamente. Allyrio precisa ser lido. Não para ser cultuado, não se trata aqui da criação de mais um vulto histórico ou literário, trata-se aqui de reparação histórica sobre um escritor que provocou certos impactos e que 70 anos após a sua morte, grande parte dos seus conterrâneos desconhece plenamente sua obra.
O Jornal Correio Paulistano publicou no dia 23 de outubro de 1934 uma análise sobre o lançamento de Os Brutos, um dos romances Allyrianos. O trecho que destaco faz uma referência forte ao comentar não apenas sobre o livro, mas também sobre Allyrio. Diz que: “Reunindo a uma prosa escorreita o calor tropical de um talento vibratil, Wanderley é um desses homens que escrevem com o próprio sangue, parecendo molhar a sua penna no coração para se expressar, de um modo todo seu, o brado vibrante e piedoso, da sua alma rebelde contra as miserias fataes da vida”.
Assim como Allyrio dizia que era espectador e como espectador também era juiz, hoje somos espectadores e também juízes da obra desse sertanejo ilustre ainda desconhecido.