A Babilônia
29 de abril de 2022A Babilônia por Misael Nóbrega de Sousa.
Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 29/04/2022.
A Babilônia foi um relicário de minha infância. Ali, cometi os meus primeiros pecados. O passado é próprio de nós, eu sei. Mas, são essas lembranças que hoje acalentam meus filhos, feito canções de ninar; e, em sendo assim, recrio o universo. Além do mais, não teria memória para guardar tanta poesia. Vivíamos na Praça da Babilônia mais brincadeiras Santas que ingênuas. E às vezes desafiávamos o céu. Morrer era coisa de adulto, invencionice… – E, menino algum acredita na morte, ainda que virem anjo.
A fonte, parida no centro da praça, esguichava raios luminosos, extrapolando a circunferência arquitetural da Babilônia. Uma atmosfera meio mística se criava a partir daquele encantamento. Tocávamos no arco-íris que se formava a nossa frente com nossas próprias mãos… – Dá para conceber uma imagem mais formidável? Virginais, não entendíamos os signos da vida (e nada era para ser compreendido mesmo)… – E as gotículas que se desprendiam daquela queda d’água (pura), tornavam-se, além disso, vivas. Guiadas pelo vento, seguiam o caminho que bem quisessem; e, rodopiavam no ar, até que desciam sobre nós, como que nos benzendo.
Abraçávamos a fonte e, agarrados a ela, de forma chorosa, implorávamos, inconscientemente, que nos fosse concebida a ambição de nunca crescer. Uma tolice das idades pueris. O homem se define, por completo, quando o ciclo da narrativa está abarrotado dele mesmo. O Sagrado coração de todas as Marias que nos puseram no mundo… – Rogava por nós. Era de minha mãe o colo em que me deitava para contar estrelas. E, eram dela, ainda, os “carões” pelas travessuras da prematuridade. E, foram, também, minhas primeiras lições de moral.
Éramos impossíveis.
Afamada Praça da Babilônia…
– Que antes de ser qualquer coisa, abrigou a casa da câmara; e, fez companhia à Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Foi, também, parenta do antigo Ginásio Diocesano, hoje Monsenhor Vieira; e, também, do sobrado de Dr. Alcebíades. Já se chamou: Independência, João Pessoa, Edivaldo Motta… – Disse que abraçávamos a fonte? Em volta desse abraço: os canteiros, as flores, os pássaros, as mariposas e tudo o mais que se pudesse abraçar.
A Babilônia ainda permanece imponente com o seu recobrimento de concreto e todas aquelas árvores, testemunhas de mim. Mas, bem que podia voltar a ser de carne e osso, como antigamente; quando nós crianças, por exemplo. Pena que essas crianças ficam na infância. – Até que se descobrem inventários de sua própria história… (silêncio).
No movimento convulsivo da vida, um moleque de canelas alongadas e sem perversidade nem nada, todo sujo da imundície do dia, corre pelos mosaicos da Praça da Babilônia. Sou eu, menino… Só pode ser… Eu, menino!