Nascimento do Arraial de Nossa Senhora do Bom Sucesso do Piancó

23 de março de 2022 Off Por funes

Nascimento do Arraial de Nossa Senhora do Bom Sucesso do Piancó por Helmara Giccelli.

 

Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 07/01/2022 .

 

Para desvelarmos uma cidade, antes de tudo, é preciso conhecermos sua espacialidade, os atos dos homens e mulheres que edificaram paredes em cimento e concreto, e também que imprimiram suas marcas pessoais nos espaços consumidos cotidianamente. Situada a 372 km da capital do estado, Pombal tem suas origens no século 17, estando sua fundação ligada às ambições imperialistas dos portugueses que começavam a “desbravar” os sertões, em busca de riqueza e poder. É, portanto, por esta via que chegamos ao luso-brasileiro Teodósio de Oliveira Ledo, fundador do Arraial de Nossa Senhora do Bom Sucesso do Piancó, futura cidade de Pombal.

 O lugar escolhido, o Sertão das Piranhas, nas planícies do Vale do Piancó, às margens do rio de mesmo nome. Tendo sido o rio, possivelmente, o fator que impulsionou a escolha do local. Mas o território não era desabitado, viviam na região vários povos brasilíndios, em face do que houve inúmeros conflitos envolvendo os colonizadores e os “nativos” pela posse da terra. A resistência estendeu-se até 1719, o que gerou um verdadeiro genocídio daquela população primeira.

O Sertão da Paraíba viveu de fato dias de dor, fazendo jus ao nome que batizava a região: Piancó, que em língua tupi significa aquele que provoca dor, terror, sofrimento. Mas a origem de uma cidade não podia estar fundada somente em “sangue e morte”, assim nasceu o “mito da origem” de Pombal, mito este criado com o escopo de glamourizar os eventos que marcaram a chegada dos “conquistadores” àquela região. Misto de saga e heroísmo, Pombal, no Alto Sertão da Paraíba, teve a sua versão da origem, no mito cristão. De acordo com o Padre Otaviano, citado por Verneck Abrantes de Sousa, em 1719, eram “mais de dois mil índios. Era desigual o combate. Inevitável o trucidamento dos colonos.

Ali estava um religioso de Santo Antônio, em prece fervorosa, no aceso combate (entre ameríndios e colonizadores). O piedoso franciscano invoca a proteção de Nossa Senhora do Bom Sucesso com a promessa de lhe erigir uma igreja mais digna de sua glória, constituindo-a sua padroeira. O voto foi deferido. Os bárbaros fugiram assombrados ante a resistência cristã.” Ora é evidente que não foram as orações daquele religioso que expulsaram os antigos habitantes daquela planície. Foram as atrocidades, as mortes provocadas pelo uso de armas de fogo que fez recuar os nativos. A luta foi tão desigual, conforme afirma Wilson Nóbrega Seixas “que não houve nenhuma morte da parte de Teodósio. Ao contrário, foram mortos 32 índios, feitas 72 presas e mortos a ‘sangue frio’ outra quantidade”.

Mas a narrativa cristã, ao mesmo tempo em que justificou as barbáries cometidas pelo luso-brasileiro, engrandecendo aquele ato fundador e transformando Teodósio em herói, vinha também reforçar a fé na santa que se tornou a padroeira da cidade. Assim, Deus estava, no princípio, fundador de tudo. Esta explicação mítica ainda ecoa entre os habitantes mais antigos da cidade, que não admitem a possibilidade de não ter sido a força da oração que desfez a muralha que representavam os “nativos” para a conquista dos sertões.

 O Arraial erigido no Vale do Piancó marcou o início do povoamento luso-brasileiro no Sertão da Paraíba. O referido povoado foi elevado à condição de Vila, com a denominação de Pombal, em 1772; em 1862 a Vila de Pombal foi elevada à condição de cidade. Pombal foi a quarta vila da Província a tornar-se cidade. Primeiro veio Areia em 1846, depois Sousa, em 1854, Mamanguape no ano de 1855 e, finalmente Pombal em 1862. Muito emblemático é o fato de que Pombal, mesmo sendo o núcleo irradiador da conquista do Sertão da Paraíba, ter apresentado pouco desenvolvimento econômico e urbano.

 De acordo com Irineu Joffily, em 1892, a cidade tinha 230 prédios, duas igrejas, uma das quais ainda não concluída e a cadeia, a maior e a melhor do interior do estado. “Pombal apesar de ser como vila, a mais antiga do Sertão, é a menor das 10 cidades da Paraíba”. A rigor, o processo de urbanização em Pombal iniciou-se a partir dos anos 1920, tendo como marco a implantação da usina de luz, em 1927, estendendose pelas décadas seguintes, sem pressa, conforme nos indicam os documentos compulsados.

Em 1920, a população do município, compreendendo a área rural e urbana, era de aproximadamente 19.299 mil habitantes, tendo elevandose este número para 28.311 nos anos 1930 e atingindo na década de 1950 o total de 50.292 habitantes. Enfim, no início do século 20, a cidade era ainda muito acanhada, quase rural, desprovida de velocidade, um espaço onde o tempo era marcado talvez pelo ritmo dos poucos acontecimentos.

Mas, sem dúvida, um território de desejos. Desejo de figurar entre as cidades que viviam uma suposta modernidade.