Dose dupla – Escritos sertanejos

2 de setembro de 2024 Off Por Funes Patos

Dose dupla – Escritos sertanejos Por Natanael Sousa.

Texto extraído da coluna Funes do Jornal a União publicado na data de 30/08/2024.

 

Eu lembro que quando eu era criança, aos 11 anos de idade, ficava apavorada quando aparecia uma barata no meu quarto. Dessa idade, eu já dormia sozinha, e não tinha medo de nada, exceto desse inseto monstruoso chamado barata.

É impressionante, parece que a barata sabe quando a gente tem medo dela e, por isso, aparece de propósito, no meio da noite, principalmente quando estamos sozinhos. No meu caso, eu não tinha medo, eu tinha horror mesmo: quanto maior a barata, maior o meu medo, um medo inexplicável. Se eu visse esse inseto de longe, minha pele ficava toda arrepiada. Não demorava muito, até eu começar a coçar todo o meu corpo, achando que a barata poderia estar em mim, por baixo dos meus cabelos, ou sabe-se lá onde.

Só sei que todas as vezes que isso acontecia, quero dizer, sempre que eu me encontrava com esse mal, a
barata, eu ia até o quarto da minha mãe, que ficava ao lado, e dizia que tinha uma barata no meu quarto. Ela, já sabendo da minha fobia, ia rapidamente dar fim ao inseto. Depois que ela cumpria a sua missão de mãe, de me manter segura, eu pedia que ela ficasse deitada comigo, na minha cama, até eu pegar no sono. Só para garantir que outra barata não iria aparecer, e se aparecesse, ela estaria lá para me proteger.

Hoje eu não sou mais criança, tenho 26 anos. Adivinha? Eu ainda tenho horror a baratas. Porém, a minha mãe não está aqui para cumprir a sua missão de me proteger do terrível inseto. Minha mãe está morta. Comprei um SBP no supermercado, mas não é a mesma coisa. Até eu conseguir matar o inseto, é uma grande peleja. E o pior, preciso dormir sozinha depois do susto. É necessário tomar um chá de camomila para me acalmar e novamente voltar a dormir.

Tem dias que a gente sente muito mais a falta de uma mãe, principalmente uma mãe super-heroína que nos protege dos nossos maiores medos. Às vezes, eu fico lembrando de como era ter uma mãe no quarto ao lado, sempre que eu precisava. Mas, em nossa memória, as mães ficam para sempre. Talvez não estejam mais no quarto ao lado, mas estão sempre com a gente.
(“Ter uma mãe”, Ellen Diniz)

A ausência de pessoas com deficiência na política reflete um vazio profundo na representatividade democrática. Quando a voz de uma parcela tão significativa da sociedade não encontra eco nos espaços de poder, estamos diante de uma lacuna que vai além da simples falta de inclusão; trata-se de uma invisibilidade estrutural que perpetua a exclusão.

A política, em sua essência, deveria ser o lugar onde todos se encontram, onde as diferenças se convertem em força, e onde as necessidades diversas da população são atendidas de forma justa. No entanto, a realidade nos mostra que, frequentemente, os direitos das pessoas com deficiência são negligenciados, tratados como uma pauta secundária. Essa negligência não é apenas uma omissão, mas um sintoma de uma visão limitada sobre o que significa ser uma sociedade verdadeiramente inclusiva.

A inclusão das pessoas com deficiência na política não é uma questão de caridade ou benevolência, mas de justiça. É um direito de participação plena, de ter um lugar à mesa onde as decisões que afetam suas vidas são tomadas. Quando os políticos falham em incorporar essa inclusão, eles perpetuam um ciclo de marginalização que reforça barreiras ao invés de derrubá-las.

Falta nos políticos a sensibilidade para compreender que a inclusão da pessoa com deficiência é mais do que rampas de acesso ou leis que garantem direitos; é sobre garantir a voz dessas pessoas na construção do futuro. Sem essa inclusão efetiva, estamos condenados a repetir erros históricos, onde a deficiência é vista apenas como um problema a ser resolvido, e não como uma condição humana que deve ser respeitada e valorizada.

Assim, a política se torna um espelho de nossa sociedade: quanto menos vemos pessoas com deficiência representadas, mais nos distanciamos de uma verdadeira democracia, uma democracia que não apenas tolera as diferenças, mas as celebra e as utiliza como base para uma sociedade mais justa e equitativa.
(“A política sem”, Natanael Sousa)